quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

ROTEIRO DE UM DESASTRE ANUNCIADO


21 de fevereiro de 2013.


Philippe Guédon

Um Partido elabora ou introduz alterações no seu Estatuto. As que desejar, segundo a índole de seus dirigentes. Boas ou más, bem intencionadas ou prenhes de malfeitos.
A primeira etapa a cumprir é o registro da ata que aprovou o Estatuto em Cartório de Títulos e Documentos de Brasília/DF. Este vai verificar alguns pontos, mas sei – por experiência vivida e sofrida - que não verificará se o Estatuto foi aprovado de acordo com as normas estabelecidas nos documentos internos em vigor. Se estiver escrito na ata que havia quorum e que o Estatuto foi aprovado por aclamação, unanimidade ou pela maioria, não conferirá; se os presentes eram filiados ou transeuntes que passavam na rua e foram colhidos a laço, tampouco;
se o edital de convocação estava correto e foi cumprido, ou se foi alterado no grito, é-lhe indiferente. As qualificações de quem assina a ata podem ser falhas e até mesmo pode se dar o fato de um advogado que assegura ser o texto a expressão da verdade não figurar na lista de presenças!... Constato que os Cartórios de Títulos e Documentos de Petrópolis/RJ são N vezes mais severos do que sugerem os padrões observados no DF.
Carimbado o documento pelo Cartório, é levado para registro (termo usado pela CF) ou anotação (como diz o TSE) no Tribunal. Essa diferença semântica não é grave, pois o TSE, por razões que não consigo conhecer e muito menos entender, manda simplesmente “anotar” e publica no seu site que o Estatuto foi “APROVADO”. Tudo se passa como se ninguém o lesse, pois a quantidade de horrores estatutários anotados e ditos “aprovados” pelo TSE é uma grandeza. Exemplo? As derradeiras versões dos estatutos do PHS, anotadas e “aprovadas”.
Através de Acórdão votado pelo Plenário dos Ministros do TSE e com a presença do MP Eleitoral, constatada a satisfação das condições previstas pela Resolução nº 23.282/2010 (basicamente, o registro no Cartório), é autorizada a ANOTAÇÃO. E aí, de repente, essa anotação vira APROVAÇÃO no site do TSE. Por que? Não sei. O que sei é que enseja a decadência partidária que conhecemos.
Se um filiado do Partido ousa denunciar o descumprimento de um dispositivo estatutário, não poderá ingressar com uma ação no TSE. Por serem os assuntos partidários de natureza interna corporis (algo como “problema seu”), o filiado tem que ir bater às portas da Justiça Comum da sede do Partido, usualmente em Brasília/DF. Deverá pagar tudo de seu bolso:
custas, cópias, correio, advogado, viagens, estadia, taxi e tempo. O Partido usa os recursos do Fundo Partidário... Depois de algum tempo, o demandante constatará que não é tão fácil para um Juiz de 1ª Instância, para atender ao Sr. João Ninguém, afrontar uma APROVAÇÃO de uma Corte Superior, mesmo uma aprovação que creio nunca ter existido. E assim, são dilatadas as probabilidades do infeliz ficar sabendo, depois de um ano ou dois, que o seu pedido inicial não pode ser considerado. Mas querendo recorrer e pagar nova conta, sinta-se à vontade.
Quem já descobriu esse “vácuo judicial” há muito tempo, foram os espertos da política.
Creio até que ajudaram a criá-lo. Pois, em verdade – salvo se nada entendi – ninguém lê nem
controla estatuto, embora carimbem, registrem, anotem e até APROVEM. E, assim fazendo, impedem que se julguem questões levantadas a seu respeito. Direito ao contraditório? No caso, não existem condições para o seu exercício.
Quando ouço falar da fragilidade e da decadência de nossos Partidos por doutos senhores e senhoras, fico torcendo para que o óbvio seja dito: tudo se passa como se o objetivo do quadro legal montado fosse o de permitir que os partidos virassem feudos das oligarquias que os controlam. Deveriam defender os valores democráticos, mas rejeitam a alternância no poder. Ou submetem plenários de Convenções à vontade de meia dúzia de três ou quatro. E tudo isso é “aprovado” por Corte Superior. Onde? Eu não achei onde ocorre a “aprovação” apregoada.. Só constato o fato. Grito, mas a minha voz é débil demais.

Sou octogenário, devo entender tudo errado. Por favor, me provem que digo bobagens e que os Estatutos partidários não são alterados a bel prazer de meia dúzia e adotam as normas mais doidas por saberem estes que não serão submetidos a controle. Adoraria estar errado, pois seria bom para o Brasil. Mas acho que estou certo, e os brasileiros estão sendo prejudicados.

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